Além de serem as mais afetadas pela crise climática, elas também vêm sendo prejudicadas pelo atual modelo de transição energética
Por: Bruna Provazi
Crédito da foto: Yasmin Thomaz/CUT
A crise climática mundial não afeta igualmente todas as pessoas. Diante do cenário de desigualdades pré-existentes, as mulheres têm 14 vezes mais chances de morrer em desastres naturais do que os homens. Tal vulnerabilidade se agrava em contextos como migrações e desalojamentos. É o que aponta o relatório Gênero, Deslocamento e Mudança Climática (2022), da Agência da ONU para Refugiados (ACNUR). Portanto, estratégias de enfrentamento à crise climática deveriam incorporar uma perspectiva de gênero.
Em estados como Rio Grande do Norte e Ceará, protagonistas no processo de transição energética em curso no Brasil, a forma como os empreendimentos de energia eólica vêm sendo implementados têm causado prejuízos ao trabalho e à vida das mulheres, como relata Tatiana Muniz, militante da Marcha Mundial das Mulheres do município de Tibau (RN), no minidocumentário “Caminhos para uma Transição Energética Justa”, produzido pela CUT Nacional, com apoio do Centro de Transição Justa da Confederação Sindical Internacional (CSI). É o caso das linhas de transmissão de energia que atravessam os chamados quintais produtivos, espaços nos quais elas geram sua renda própria com o plantio de alimentos e criação de pequenos animais.
“O vento é limpo? É, mas um vento limpo que causa [impacto] à vida das mulheres. Aqui está se vendo a devastação da terra que não é mais ocupada pela agricultura. A gente sabe que a maioria das linhas de transmissão pegam os quintais das casas. O marido está trabalhando fora, ele visa mais algo futuro que pode receber – só que nunca vai receber. E aquele espaço que as mulheres tinham livre, dos seus roçados, ao redor das suas casas, elas não têm mais. Então impacta diretamente a vida das mulheres”, afirma Tatiana.
A Central Única dos Trabalhadores defende que, para que essa transição ocorra de forma justa, é preciso haver diálogo e participação das comunidades locais, tendo em vista ainda que o trabalho ocupa lugar central na organização da vida da população.
Desigualdade de oportunidades
A companhia AES Brasil criou, em 2023, o primeiro complexo de energia eólica totalmente operado por mulheres no país, em parceria com o Senai. O complexo fica localizado na Bahia, entre os municípios de Tucano, Biritinga e Araci. Entretanto, esta ainda é uma exceção.
Para além dos efeitos sócio-ambientais causados pelos empreendimentos de energias renováveis em suas comunidades, as mulheres ainda enfrentam desigualdade de oportunidades no setor. Segundo relatório da Agência Internacional de Energia Renovável (IRENA), elas constituem apenas 32% dos trabalhadores empregados na indústria de renováveis, e 22% do setor de energia em geral.
Complexo eólico operado totalmente por trabalhadoras na Bahia. — Foto: Divulgação.
Transição energética justa para todas as pessoas
A Marcha Mundial das Mulheres defende que, para que essa transição seja de fato justa, ela precisa ter uma perspectiva feminista que contribua para a redução das desigualdades da sociedade patriarcal.
A CUT afirma ainda que, para haver uma transição energética justa, é necessário garantir emprego e trabalho decente, aliado à justiça social e ambiental, proteção dos direitos humanos e participação das comunidades envolvidas. Ou seja, não basta alterar a matriz energética, é preciso alterar o atual modelo de desenvolvimento, produção e consumo.
Assista ao minidocumentário “Caminhos para uma Transição Energética Justa”