Resultado parcial de estudo realizado nas regiões Norte e Nordeste foi apresentado em seminário virtual da CUT
Foram divulgados os primeiros resultados do estudo “Transição energética justa na perspectiva dos trabalhadores – eixos Norte e Nordeste”, desenvolvido pela CUT Brasil, em parceria com o Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis Zé Eduardo Dutra (Ineep), e com apoio do Instituto Clima e Sociedade (iCS). A divulgação ocorreu em um seminário virtual realizado no dia 5 de dezembro, com a participação de representantes de organizações sindicais, movimentos sociais, universidades, ongs e da sociedade civil.
A atividade é realizada pela Secretaria Nacional de Meio Ambiente da CUT e contou com a facilitação e moderação da Rosalina Amorim, Secretária de Mobilização e Relação com os Movimentos Sociais da CUT Brasil, Na abertura do seminário, Daniel Gaio, Secretário Nacional de Meio Ambiente da CUT, apresentou o minidocumentário “Caminhos para uma Transição Energética Justa”, lançado pela CUT em outubro deste ano. Daniel ressaltou a importância do levantamento de dados para compreender os impactos da transição energética na vida da classe trabalhadora. Neste sentido, citou trabalhos realizados pela CUT junto a parceiros como o Ineep, Dieese e iCS.
Gaio relembrou a recente retomada do protagonismo do Brasil na pauta ambiental, como demonstra o pronunciamento do presidente Lula na COP28. Porém, ressalta que é necessário aproximar os trabalhadores e trabalhadoras do assunto da transição energética para que possam incidir nessa agenda. Essa será uma agenda prioritária da CUT para a COP30, que ocorrerá em Belém do Pará, em 2025.
Mudanças do setor energético no Nordeste brasileiro
Mahatma Santos, diretor técnico do Ineep, ressaltou o trabalho de pesquisa desenvolvido pelo Ineep acerca do tema da transição justa junto à CUT. Em seguida, a economista Julia Bustamante apresentou as principais atualizações do estudo “As mudanças do Setor Energético do Nordeste Brasileiro e seus impactos sobre os Trabalhadores”.
Segundo o mapeamento realizado pelo Ineep, nos últimos dez anos, os investimentos em fontes de energia eólica tiveram aumento expressivo no Brasil, saltando de 5%, em 2013, para 55,9%, em 2023. A região Nordeste é responsável por aproximadamente 92% da capacidade instalada em eólica em 2023, sendo os estados do Rio Grande do Norte e Bahia os maiores produtores. Já a geração de energia solar nessa região cresceu de 0 para 7%. Apesar da expansão ocorrida na última década, os investimentos em energias renováveis vêm desacelerando, gerando consequências como declínio nos postos de trabalho, desde 2015.
A pesquisa citou os futuros investimentos em hidrogênio verde, anunciados em 30 bilhões de dólares, e o debate em torno do Programa Nacional do Hidrogênio (PNH2), em tramitação no Senado. Os empreendimentos de eólicas offshore – ou seja, em parques localizados dentro do mar -, pretendem aproveitar o potencial da costa marítima do Nordeste brasileiro. Entretanto, estima-se que esses empreendimentos vão aprofundar ainda mais os impactos locais, afetando desde o ecossistema marinho quanto o turismo litorâneo.
O caminho do Nordeste
João Pedro Matias, consultor do projeto no Eixo Nordeste, apresentou o cenário atual e as perspectivas para o trabalho no setor de renováveis nesta região. Foi destacado o potencial da geração distribuída de energia na redução de despesas, geração de empregos locais e no fortalecimento de novos modelos de organização comunitária.
Quanto ao perfil dos trabalhadores e empregos, o estudo identificou baixa participação de mulheres e menor remuneração no setor, comparada aos homens. Entre 2018 e 2020, observou-se um pequeno aumento na proporção de mulheres nos empregos dos setores verdes, em especial nas ocupações de apoio (Dieese, 2022). O Brasil gerou aproximadamente 1,4 milhões de empregos ligados às renováveis, atrás apenas da China e à frente dos EUA e da União Europeia (IRENA, 2023).
Apesar de a transição no setor energético ter o viés de geração de empregos, é importante avaliar em qual etapa esses empregos estão sendo ofertados e em quais condições. A autonomia energética é fundamental para o país, mas é importante entender como esse processo está ocorrendo, quais os seus impactos socioambientais e se existe diálogo com as organizações representativas da classe trabalhadora.
As etapas seguintes do diagnóstico preveem a realização de entrevistas com diferentes setores (privados, públicos e movimentos sindicais), o mapeamento da requalificação profissional do setor elétrico e as consequências dos investimentos em renováveis (solar, eólica e biodiesel) para a classe trabalhadora.
Perspectivas para o eixo Norte
O diagnóstico situacional preliminar da região Norte foi apresentado pelo professor da Universidade Federal do Pará e consultor local do projeto, José Trindade. Como o estudo deste território ainda está em etapa inicial, foi apresentada uma perspectiva geral.
Na região Norte, os empreendimentos de energia solar estão presentes em maior quantidade comparado aos eólicos, sobretudo em comunidades. Além dessas fontes, foi destacado o potencial do hidrogênio verde, em especial no Pará.
Na etapa seguinte da pesquisa será aprofundada a análise de geração de empregos e o levantamento de dados acerca dos setores econômicos vinculados às energias renováveis, como segmentos de biomassa e de produção de energia solar e hídrica.
Aprofundando o diagnóstico
Os participantes denunciaram outros impactos sociais e econômicos negativos desses empreendimentos, tais como desapropriação de territórios de povos tradicionais, ameaça à produção de alimentos orgânicos e, consequentemente, perda de postos de trabalho no campo, com a construção dos parques eólicos e solares. De maneira semelhante, a construção dos parques offshore também afetará diretamente as comunidades pesqueiras e a geração de renda nessas regiões.
Conforme foi apontado pelos resultados preliminares do diagnóstico, os empregos gerados com a energia limpa estão concentrados na etapa de construção dos empreendimentos, os quais, em sua maioria, são realizados por empresas externas e terceirizadas, dificultando a atuação dos sindicatos. Após instalados os parques, eles passam a ser controlados remotamente, ou seja, sem emprego da mão de obra local. Soma-se a isso a utilização de componentes produzidos fora do Brasil ou em outras regiões do país nos empreendimentos eólicos e solares, quando essa produção poderia ser internalizada.
Portanto, para além do discurso de que o setor de renováveis gera empregos para o país, é preciso mapear em que etapa da cadeia produtiva são gerados esses empregos e sob quais condições. Neste sentido, o diagnóstico situacional do trabalho representa uma ferramenta estratégica, seja para articulação de políticas públicas, seja para mobilização da sociedade ou para conhecimento internacional sobre o tema. Faz-se necessário também ampliar essa discussão com o conjunto da classe trabalhadora. Os resultados finais do estudo serão apresentados em atividades futuras da CUT.
Crédito da foto: Yasmin Thomaz / Vídeo “Caminhos para uma Transição Energética Justa”.